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Sem outubro alemão (Manuel Kellner e Angela Klein)



Sem outubro alemão – o breve florescimento da Revolução Alemã

(novembro, 2011)

Manuel Kellner e Angela Klein

Tradução de Nina Lins



Os meios de comunicação de massa atuais lembram do dia 9 de novembro como o “Nascimento da Democracia”, ainda que naquela época não quisessem saber disso. A grave derrota na guerra, que não podia ser ignorada, e a força do movimento revolucionário com a criação de potenciais órgãos de contra-poder na forma de conselhos forçaram os antigos governantes a abdicar.


Os burgueses liberais e os sociais-democratas propuseram-se imediatamente a se distanciar das novas estruturas, tomando a liderança do movimento revolucionário com a promessa de um marco na socialização da economia, derrubando tudo o que o novo centro do poder em torno do Conselho de Representantes do Povo e da liderança em geral poderiam ter colocado em questão. Essas forças dificilmente contribuíram para o “Nascimento da Democracia”, o que talvez explique o por quê de 9 de novembro ser visto até hoje na Alemanha como a Noite do Pogrom de 1938, mas não como uma revolução alemã.


Como foi a situação no Reich?


De fevereiro a dezembro de 1916 houve uma grande perda para o exército alemão, 240.000 soldados morreram antes de Verdun, e em dezembro começou uma contra-ofensiva da Entente. Hindenburg e Ludendorff, no pico do Reichswehr, reforçaram uma guerra submarina assassina, da qual o fracasso foi constatado em abril de 1917. Os lares proletários sofreram com a redução da oferta de alimentos básicos. No campo, a insatisfação também cresceu. A Revolução Russa de fevereiro de 1917 varreu o regime czarista. Mas a aprovação social-democrata dos empréstimos e da guerra em si não foi justificada pela luta contra a “pobreza de sangue”? Entre a população, cresceram a dúvida e o desejo de acabar com a guerra. Hugo Haase, do USPD, perguntou ao chanceler no Reichstag, se queria que as massas na Alemanha começassem a “falar russo”.


Em abril de 1917, começou um movimento de greve em várias cidades grandes. As reivindicações se baseavam principalmente no aumento da taxa de carvão e de pão, em uma inciativa do governo a favor da paz, na extinção do Estado de sítio e da censura, na libertação de presos políticos, na introdução de direito ao voto irrestrito e em todos os níveis. As assembléias gerais das empresas defenderam as reivindicações dos Conselhos.


Nas embarcações de guerra, criou-se uma rede secreta de marinheiros. Motivados pela Revolução Russa, liam publicações de esquerda, entraram em contato com membros do USPD, organizaram o abandono de navios e greves de fome. No dia 26 de agosto a organização foi destruída e cinco membros foram mortos. No dia 5 de setembro de 1917, os líderes Max Reichpietsch e Albin Köbis foram baleados.


A partir de outubro de 1918, os marinheiros da frota de alto mar de Kiel e Wilhelmshaen provocaram uma revolta contra a liderança, a qual – em contraste com o governo do Reich – queria eliminar as embarcações de guerra e liderar a guerra seguinte. Os trabalhadores do estaleiro entraram em greve e se solidarizaram com os marinheiros. Dentro de uma semana, a Revolução incendiou a Alemanha. Os conselhos de trabalhadores e soldados surgem em todos os lugares como um único poder político. Wilhelm II (Guilherme II) abdicou e fugiu para Holanda. Max von Baden tornou-se chanceler do Reich. No dia 9 de novembro, nas ruas de Berlim, diante da falta de vontade de todas as tropas ali presentes de disparar contra a população, nomeou-se o presidente do SPD Friedrich Ebert como o novo chanceler do Reich. Ao seu redor, um Conselho de Representantes do Povo, composto por seis membros – três do SPD e três do USPD, os quais os Conselhos de Trabalhadores e Soldados nomearam para o governo.


Sem outubro alemão


Por um longo período, houve na esquerda o mito de que em novembro de 1918 a Revolução poderia ter acontecido, não fosse apenas pelo SPD. Um “Outubro” alemão, como no ano anterior na Rússia, poderia ter sido possível. Uma nova pesquisa histórica, também de esquerda, contradiz isso.


Na Rússia, os bolcheviques, que no começo representavam minoria nos Conselhos, tiveram nove meses para convencer a maioria. Seus oponentes “moderados” - os mencheviques e os socialistas revolucionários – queriam, como na Alemanha, manter uma democracia burguesa sem alterar o poder dos capitalistas e dos grandes proprietários de terras. Um longo e paciente trabalho de convencimento para persuadir a massa de trabalhadores de que a guerra poderia acabar e os bolcheviques tomar o poder foi implementado, a partir do processamento vigilante de novas experiências.


Ao contrário dos radicais de esquerda do SPD, os bolcheviques tinham anos de experiência como movimento independente e como força política e organizada. E com a Revolução de 1905, houve um tipo de ensaio geral, o que foi uma boa lembrança para 1917. Na Alemanha, no outono de 1918, tudo desabou junto, como um castelo de cartas. Fora isso, as mulheres presentes na Rússia – ao contrário da Alemanha, e em ambas as Revoluções! – foram pioneiras do movimento revolucionário.


Unidade Socialista


Quem observa a história alemã com um binóculo, pode perguntar: o SPD não falhou miseravelmente na frente de todos em 1914 ao se submeter à guerra imperialista e concordar com a capital em “cidade da paz”? Como pôde então manter tanta autoridade em 1918/19? Peguemos então a lupa. Os trabalhadores da social democracia eram muito apegados ao seu partido, e esperavam que fosse possível voltar a ter paz como antes. As novas classes politizadas eram a favor da paz, da democracia e das conquistas sociais, e não da revolução socialista. Eles se voltaram para o SPD primeiro. O USPD surgiu apenas porque, na guerra, o SPD tinha expulsado metade da oposição – eles queriam realmente continuar a representar suas posições no SPD. Desse modo, o USPD tinha centenas de milhares de membros e, em muitos lugares, era mais forte que o SPD.


Transição para a contra-revolução


O clima das massas em novembro era alegre e corajoso. Os participantes acreditavam que já tinham alcançado o essencial no sentido de ser uma unidade socialista e, portanto, se irritavam com o que viam das brigas dentro da esquerda. Regularmente defendiam órgãos executivos compostos pelo SPD, USPD e radicais de esquerda. O aparato de liderança do SPD, lavado com as águas burocráticas das manobras, explorou esse clima até o fim. Ainda que o SPD fosse minoria nos Conselhos, reforçou a paridade em um terço; mas onde as forças de esquerda estavam em minoria, elas dificilmente apontaram à proporcionalidade, nem governaram sozinhas.


Em Berlim, no dia 24 de dezembro, Ebert, de acordo com seus interlocutores no Comando Supremo do Exército, enviou tropas contra quase 1.000 membros e a Divisão da marinha popular, para quem o salário foi negado e deveria ser dissolvido. O barulho das armas convocou grandes multidões para ajudarem às pressas. Os marinheiros que tinham obtido seus salários à força recusaram o ataque. Em 29 de dezembro, três membros do USPD deixaram o Conselho de Representantes Populares. Apenas os membros do SPD permaneceram e assinaram a primeira explicação – um pedido de “Paz e Segurança” – somente com o "governo do Reich”.


Esse episódio é importante para avaliar os eventos de 5 a 12 de janeiro de 1919, os quais ainda, contrafactualmente, sempre são reconhecidos como o “levante de Spartacus” que falhou. No fim de dezembro, a liga Spartacus deixou o USPD e, junto com os “radicais de esquerda” de Bremen e de outros lugares, fundou o KPD com cerca de 50.000 membros. O congresso fundador foi caracterizado a partir de humores/motivações de ultra-esquerda, que contra o Conselho de Rosa Luxemburgo decidiu não participar das eleições seguintes do Reichstag. As negociações para juntarem-se aos líderes revolucionários de Berlim falharam nos bastidores do Congresso. Até o final de 1920, o KPD não teve o florescimento da vanguarda proletária da época – o que também foi uma grande diferença em relação aos bolcheviques, os quais já antes da revolução estavam estreitamente ligados à vanguarda dos trabalhadores nas fábricas.


* Manuel Kellner e Angela Klein para a SoZ (Sozialistische Zeitung) – tradução de Nina Lins.

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