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Reflexões sobre "a questão do partido" (versão expandida) – uma visão geral (Pierre Rousset)


Reflexões sobre "a questão do partido" (versão expandida) – uma visão geral

Pierre Rousset

Tradução de Luciano Dutra

Revisão de Pedro Barbosa

Por ocasião do centenário da revolução russa, a revista Viento Sur me pediu um artigo sobre "a questão do partido" (Rousset, 2017). Esta é uma versão expandida de tal texto. Esta versão se foca muito mais no presente do que no passado – e visa contribuir para um debate internacional, não apenas francês.


Correções ou esclarecimentos provavelmente serão acrescentados no futuro.



A questão de um partido militante nos remete a elementos de análise bastante gerais (a teoria da revolução social no capitalismo – que é a própria finalidade do marxismo), mas também a uma série de situações concretas que são muito diferentes entre si e que seria muito difícil sintetizar. Então, me limitarei aqui a algumas reflexões introdutórias breves.


Partidos, períodos, consciências


Obviamente, eu vejo a questão do partido do ponto de vista da esquerda radical e anticapitalista. Estivéssemos nos anos 60 ou 70, estaríamos falando do ponto de vista da esquerda revolucionária. Eu diria que a mudança para o adjetivo “radical” apenas registra uma mudança do estado de coisas. Em muitos países – começando pelos que compõem a Europa – o nível e a qualidade das lutas sociais não são suficientes para dar corpo a uma organização revolucionária. O adjetivo “revolucionário” não se refere apenas a um programa. Nas décadas de 1960 e 1970, a vida cotidiana de militantes da extrema-esquerda era diferente da dos social-democratas reformistas e dos partidos stalinistas. Muitas atividades tinham que ser total ou parcialmente clandestinas. A perspectiva era a de uma forte ascensão da luta de classes e tínhamos de estar preparados para isso. Os Estados, aliás, estavam se preparando para isso, em países como a França, e a repressão visava principalmente a militância política.


Na Europa, a situação mudou após o esgotamento da dinâmica da revolução portuguesa e a saída controlada do regime do franquismo no Estado Espanhol. Uma “normalização” à esquerda da esquerda se seguiu mais ou menos rapidamente. A transição não foi fácil e uma grande parte das organizações de extrema esquerda na Europa desapareceu ao longo do caminho. Desde então, a vida cotidiana de um membro da esquerda radical não é mais tão diferente da de um adepto de um partido reformista. A perspectiva de um grande confronto de classe ficou obscurecida em um horizonte distante. De maneira sintomática, a repressão foi cada vez mais direcionada aos movimentos sociais (e as “classes perigosas” – classes etárias e sociais) e não mais aos militantes políticos enquanto tais.


Naturalmente, esta periodização varia de acordo com os países do sul, do centro ou do norte da Europa. A resistência armada tem sido prolongada em conexão com a opressão nacional (Euskadi [País Basco], Irlanda do Norte, Córsega), mas estas lutas deixaram de se inscrever em uma perspectiva revolucionária internacional, o que levantou a questão de sua funcionalidade e mudou o quadro dos processos de paz. Apesar das diferenças de contexto, este também é um fato para os países do Sul onde continuam existindo guerrilhas significativas, da Colômbia às Filipinas.


A princípio, a mudança de período levou a extrema esquerda “sobrevivente” a repensar os ritmos e as modalidades de sua construção. A corrida de “cem metros” pretendia se aproveitar – antes que ela se fechasse – da janela aberta pela crise da dominação imperialista dos anos 60. Ela deu lugar a uma longa corrida para melhor se implantar e persistir até a próxima crise. No entanto, isso só aconteceu até três décadas mais tarde (uma geração!). Quanto à mudança de período, foi muito mais significativa do que o esperado.


De fato, estamos lidando com uma mudança de época (Sabado, 2015b) marcada pela implosão da URSS e pelo fim da geopolítica dos blocos; o esgotamento da dinâmica revolucionária do século XX, inclusive no terceiro mundo; a mundialização capitalista; uma hegemonia ideológica do neoliberalismo que, embora temporária, penetrou profundamente nas consciências; e as verdadeiras perturbações [bouleversements] das estruturas sociais de norte a sul e a leste...


Neste quadro, a ruptura geracional entre os herdeiros das décadas de 1960 e 70 e os filhos da época presente se mostra particularmente grande (Rousset, 2005). Via de regra, os jovens estão pouco interessados em aprender com o passado, em contraste com a ala política da “geração 68” que se pensava como continuidade da Revolução Russa de outubro de 1917, da Revolução Chinesa de outubro de 1949, da Revolução Cubana de janeiro de 1959, da Guerra Civil Espanhola da década de 1930 e da resistência antifascista.


Esta ruptura geracional é ainda mais acentuada em países onde os “veteranos” viveram a experiência da resistência às ditaduras e aos regimes militares e onde os “jovens” entraram na política após a derrubada de tais regimes, como na América Latina ou nas Filipinas.


O que nos leva a uma questão fundamental. As concepções militantes dominantes não estão necessariamente em adequação com certas tarefas presentes ou com a natureza dos desafios futuros. Mas a ação política é conduzida a partir das consciências “realmente existentes” e não a partir de imperativos categóricos. Portanto, mesmo quando o “desejo de partido” existe, pode haver um abismo entre o partido possível (considerando as consciências) e o partido necessário (considerando as tarefas). Uma dificuldade bastante temível que leva a muitas experimentações.


Todavia, partidos úteis existiram e realmente ainda existem.


Partidos úteis possíveis e necessários


Enfrentamos hoje uma árida rejeição da própria noção de partido em uma importante ala da juventude militante, incluindo aqueles cujo engajamento pessoal é o mais radical. Pelo menos é o que vemos em alguns países. Esta rejeição é baseada em sólidas razões que devemos levar plenamente em consideração. O atrofiamento da democracia burguesa acabou por desacreditar o regime de partidos, apesar de seu significado histórico. Um setor importante da extrema-esquerda se comporta de maneira verdadeiramente manipuladora e autoritária, por vezes claramente destrutiva.


É importante ressaltar que a “forma partido” não é o único problema aqui. Todas as formas de organização passadas e presentes devem ser estudadas com uma visão crítica. Os sindicatos tornaram-se profundamente burocratizados. Uma ONG pode ser propriedade privada de uma única pessoa. As organizações comunitárias tornaram-se tão institucionalizadas que operam com escalas salariais fortemente desiguais. As redes informais são manipuladas por lideranças ocultas. Os movimentos “virtuais” substituem os procedimentos coletivos democráticos por um “clique” na Internet, sem envolver nenhum ativismo. E figuras providenciais de tipo “guru” estão surgindo aos montes.


Nenhum partido é perfeito. No entanto, no século XX, os partidos desempenharam um papel chave em todas as lutas de libertação e nas revoluções que mais levaram longe a ruptura com o capitalismo. Certamente, essas revoluções se ossificaram; deram origem a regimes burocráticos e depois abriram caminho para um novo desenvolvimento capitalista. Há múltiplas causas para isso, o que não podemos abordar aqui.


Críticos intransigentes de partidos revolucionários fariam bem em considerar o que aconteceu a revoluções sem partidos. E, de fato, o que continua a acontecer com elas nos dias de hoje. Raramente vimos um levante popular tão massivo e cobrindo uma zona geográfica tão vasta como o que é chamado de maneira mais ou menos imprecisa de a “primavera árabe”. A súbita irrupção das “massas” na arena política foi espetacular, e o combate travado contra uma série de forças contrarrevolucionárias também foi bastante notável. Merece sempre o nosso apoio; mas a iniciativa mudou de campo. A luta muitas vezes persiste em condições terrivelmente difíceis, como no teatro de operações iraquiano-sírio.


Os povos da região estão pagando um preço muito alto pela negligência e traições dos grandes partidos nacionalistas de esquerda na região árabe-persa (e além) e pela maneira como foram isolados internacionalmente pelas principais potências – mas também por conta de uma parte da esquerda radical que apoia Putin e Assad ou que optou por fazer vistas grossas. Certamente ainda existem organizações revolucionárias no Iraque e na Síria que permaneceram fiéis aos seus compromissos iniciais – e que merecem nosso respeito por continuar a sua luta em circunstâncias muito difíceis – mas foram seriamente enfraquecidas. Esta fraqueza é verdadeiramente lamentável – e quem se atreveria a defendê-la em nome de uma crítica teórica da “forma partido”?


Atualmente, apenas no Curdistão podemos apontar partidos com uma presença forte o suficiente para desempenhar um papel significativo no teatro de operações iraquiano-sírio. Alguém pode negar que a existência do PYD no Curdistão sírio foi de importância central para a resistência curda, simbolizada pelo cerco de Kobanî?


Os partidos radicais, mesmo de dimensões modestas, podem ser úteis hoje. Para ilustrar meu argumento, analisarei exemplos em dois dos países mais violentos da Ásia, o Paquistão e o sul das Filipinas. No primeiro, o Awami Workers Party (AWP) [Partido dos Trabalhadores de Awami] opera de maneira inteiramente legal. No segundo, o Revolutionary Workers Party – Mindanao (RPM-M) [Partido Revolucionário dos Trabalhadores – Mindanau] ainda opera na clandestinidade. Isto, em si, mostra que a forma assumida pelos partidos reflete não apenas o estado das sociedades (marcado por vários tipos de violência), mas também a história de lutas anteriores e diferentes organizações de esquerda.


Tanto no Paquistão como no sul das Filipinas existe uma série de conflitos religiosos, sectários e de identidade profundamente arraigados. Outros poderiam ser selecionados, mas este é o contexto que escolhi para testar a utilidade de um partido. Como proceder? Observando o que o partido faz (ao invés de o que diz); mas também se perguntando o que seria diferente se o partido não existisse em primeiro lugar.


O estado paquistanês é uma construção artificial e frágil. Sua unidade e estabilidade são minadas por questões nacionais não resolvidas; por regionalismos e comunitarismos intensos; pelo impacto da guerra afegã e dos impactos causados pelas disputas das grandes potências; pelo comportamento de clã das grandes famílias proprietárias; pelo imenso mosaico diversificado de estruturas socioeconômicas; pela extrema violência de fundamentalismos religiosos (neste caso muçulmano); e pelo viés de facção dentro das agências de segurança.


O AWP foi fundado em 2013 após o reagrupamento de três organizações (Rousset, 2013b), uma das quais foi o Labour Party of Pakistan (LPP) [Partido Trabalhista do Paquistão] (Rousset, 2010b), cujo trabalho anterior é considerado aqui. O AWP é bastante responsivo – defendendo os pequenos agricultores da fazenda militar de Okara contra a tortura; sindicalistas do trabalho têxtil em Faisalbad contra a prisão; blogueiros em prol da liberdade de pensamento e antimilitaristas contra sequestros; Hindus e cristãos cujas aldeias foram incendiadas por islamitas; xiitas e sunitas vítimas de ataques terroristas fundamentalistas; mulheres enterradas vivas por desafiar a autoridade patriarcal e manchar a “honra” de suas famílias; de pessoas transgêneros vítimas de violência; dos nacionalistas de Baloch vítimas de execução sumária; de comunidades atingidas por desastres naturais, seja por inundações no Punjab ou por terremotos na Caxemira; e dos ativistas de direitos humanos que recebem sentenças de prisão perpétua por seu trabalho solidário como em Gilgit-Baltistão. O partido também construiu relações transfronteiriças hospedando comunistas afegãos, fortalecendo laços com internacionalistas indianos e participando da construção de redes regionais e globais.


O AWP (e o LPP antes dele) luta contra todas as formas de opressão e exploração e em defesa de todas as vítimas. Reconhece a diversidade e afirma simultaneamente a natureza comum e compartilhada de uma luta progressista. No entanto, os dois nem sempre andam juntos. O foco na diversidade pode criar particularismos e identidades de caráter estreito. “Produzir” diversidade não significa necessariamente produzir algo em comum (Joshua, 2017). Por outro lado, os direitos das mulheres e das minorias foram muitas vezes sufocados em nome da unidade.


Cada iniciativa de solidariedade tem seus próprios méritos. Tomadas em conjunto, produzem uma cultura de solidariedade sem fronteiras “de baixo para cima”. E isso é uma conquista real nestes tempos de divisão! Para essa luta, o LPP, e agora o AWP, trouxe os meios de um partido enraizado em uma ampla gama de regiões e setores sociais. A ausência do partido seria dolorosamente sentida.


Por sua vez, o RPM-M (RPM-M, 2006; Rousset, 2010a) está sediado na ilha sul de Mindanau, a região mais militarizada do arquipélago das Filipinas. Todo tipo possível de organização armada está ativa por lá. Três povos coexistem na ilha: os Moros (muçulmanos), os Lumads (tribos das montanhas) e os descendentes cristãos das ondas de colonização “interna” do sul das Filipinas. Neste contexto, os conflitos sociais (especialmente por terra) frequentemente se transformam em violência comunitária. As rivalidades entre os clãs políticos (especialmente os Moro) podem se tornar sangrentas. O estado de guerra entre os movimentos muçulmanos e o governo, e a existência de grupos guerrilheiros de esquerda, levantam a questão dos pré-requisitos para uma paz justa e duradoura. Operações militares e desastres naturais provocam frequentemente catástrofes humanitárias.


A resposta do RPM-M a esta situação é defender todas as vítimas de opressão. O partido luta contra a opressão dos muçulmanos enquanto se opõe ao massacre de moradores cristãos por comandos islâmicos renegados. Reconhece o direito Moro à autodeterminação, mas se recusa a negar esse mesmo direito aos Lumads em suas terras ancestrais. Organiza as pessoas das três comunidades para trabalharem juntas para prestar assistência às pessoas atingidas por desastres humanitários. Promove a representação de todos os três povos dentro dos movimentos de paz. Luta também para garantir que os interesses das pessoas comuns e os direitos democráticos, ambientais e sociais “intersetoriais” sejam genuinamente levados em conta nas negociações de paz.


O RPM-M também é uma organização com uma base territorial. A organização é o resultado de uma divisão de uma região inteira (Centro Mindanau) do Partido Comunista Maoista das Filipinas. Enquanto argumenta que a luta armada não é a forma apropriada de luta nas Filipinas, o desarmamento também não é uma questão imediata. Uma organização baseada em território tem certas responsabilidades em relação às comunidades em que está enraizada. O RPM-M aprendeu a respeitar a governança indígena dos Lumads, que têm suas próprias forças de autodefesa para resistir a poderosos interesses especiais dos setores de mineração, silvicultura e outros. Os corpos militares da RPM-M têm uma postura defensiva e suas forças de guerrilha estão inativas; mas ainda podem fornecer reforços quando uma vila é ameaçada. Se se desarmasse completamente, o RPM-M seria incapaz de se proteger e teria que se retirar e ceder terreno a grupos armados hostis. A posição dos Lumads e das aldeias ameaçadas seria seriamente enfraquecida.


Estamos falando aqui de partidos de tamanho modesto (alguns milhares de membros), mas que têm raízes reais em várias áreas. Uma organização política enraizada apenas em um setor (nos locais de trabalho, por exemplo) não seria capaz de desempenhar o mesmo papel. Nem uma formação essencialmente parlamentar. De fato, a questão da articulação das formas e dos terrenos de luta está no coração da ação partidária.


A articulação das formas e dos terrenos de luta


Se eu nutri nossa reflexão com exemplos concretos, é porque devemos ter cuidado com esquemas muito abstratos. Não há como apagar com um traço as heranças nacionais e regionais. Na Europa, a relação entre grandes partidos e sindicatos varia muito de um país para outro. Na Índia, todo partido (parlamentar) – incluindo os de direita – tem sua própria rede de “organizações de massa” (confederações sindicais e organizações de mulheres, agricultores e juventude, entre outras). Eles frequentemente se chocam com “movimentos sociais antipartidários”. Recentemente, as organizações independentes, mas não necessariamente hostis a partidos, cresceram em importância. Qualquer iniciativa ampla levanta a questão da sua necessidade de colaboração.


Um partido não detém o monopólio da elaboração teórica e programática, ao contrário do que muitas vezes se pretendeu. Militantes de extrema-esquerda participaram ativamente das elaborações feministas na década de 1970, mas sua formulação se fez por fora das organizações políticas constituídas, muito antes de ganharem em seu interior (suscitando rejeições defensivas e conservadoras) – idem para a questão da sexualidade e da homossexualidade. O mesmo se deu com a ecologia na década de 1980; e o mesmo com as mudanças nas relações sociais e de trabalho, ou com o alcance estratégico de experiências de luta inovadoras.


No entanto, na medida do possível, os partidos militantes oferecem (podem e devem oferecer) opções globais de orientação alternativa – isto é, como articular formas e terrenos de luta em um determinado período. Enquanto tais, os partidos contribuem para preservar a unidade dos movimentos sociais – com as posições políticas heterogêneas de seus membros encontrando expressão em outros lugares, ao invés de servir para os dividir. Na medida em que divisões aparecem, elas se dão sobre o terreno próprio a cada movimento social: sindicalismo de classe ou sindicalismo rotineiro, ecossocialismo ou ecologia profunda, pequenos agricultores ou agronegócio, feminismo de luta de classe (feminismo socialista) (Trat, 2010 e 2013; Duggan, 2010) ou institucional...


Evidentemente, tudo isso pressupõe que os partidos militantes em questão respeitem o funcionamento próprio e a vida dos movimentos sociais; o que não se dá como garantido de partida. Uma solução alternativa é defendida por correntes de referência geralmente anarquista – a constituição de movimentos sócio-políticos de tipo “sindicatos revolucionários” (em período não revolucionário). Isto significa construir [organizações de] vanguardas necessariamente concorrentes no seio dos trabalhadores assalariados, impondo divisões de natureza partidária.


Dois terrenos de luta merecem menção especial aqui: a luta armada e a atividade parlamentar. Pode parecer estranho associar ambos. No entanto, os dois têm profundas implicações para o equilíbrio de uma organização e apresentam grandes perigos quando esse equilíbrio não é controlado.


Luta armada


Por vezes a luta armada impõe-se como a única via para perseguir uma luta de emancipação. A decisão de escolher esse caminho, no entanto, tem enormes consequências, por exemplo, na relação entre clandestinidade e atividades “abertas” (públicas, legais). Para limitar os riscos de derivas, mencionemos simplesmente por enquanto que outros terrenos de ação não devem estar estreitamente subordinados à luta armada. A política sempre deve continuar a comandar o fuzil. A segurança não justifica anular toda forma de debate, de democracia e de tomada de decisão coletiva. O engajamento neste terreno de atividade não deve se tornar um modo de vida do qual não se pode mais sair. Um bom partido de luta armada sabe quando suspender ou interromper o trabalho militar quando a mudança da situação política o exige.


O risco de degeneração de grupos militares aumenta quando eles se mantêm enquanto a situação não justifica mais o prosseguimento da luta armada. Isso vale mesmo para organizações que levam em conta esta situação adotando uma postura defensiva, mas que ao mesmo tempo não podem se desarmar. Assim, o RPM-M assegura uma rotação de membros no Exército Popular Revolucionário (RPA), para que os membros possam deixar os acampamentos nas montanhas e reingressar periodicamente na vida civil.


Sair da luta armada não é uma escolha simples, como pode ser visto com o RPM-M/RPA em Mindanau, com o Partido Comunista das Filipinas e com os Bangsamoros – para não falar da Colômbia. Outros movimentos (ligados especialmente às minorias étnicas, como na Birmânia) são confrontados com a questão dos processos de paz. Alguns desses movimentos se reúnem regularmente para compartilhar experiências a este respeito: uma coletivização da reflexão à qual devemos dar mais atenção no plano internacional, vista a importância destas questões.

Atividades parlamentares e institucionais


O trabalho na esfera parlamentar (e mais geralmente institucional) responde a necessidades reais. Defender em todas as arenas possíveis os direitos dos dominados. Lhes assegurar uma representação política. Combater a hegemonia ideológica dominante. Utilizar o grupo parlamentar para apoiar lutas no país e no exterior; para obter a libertação de presos políticos; para ajudar a coordenação internacional de movimentos...


Evidentemente, esse trabalho não pode ser realizado em todos os lugares e tempos. Suas modalidades e seu potencial dependem muito da natureza do regime político e da legislação eleitoral própria a cada país (que, como regra geral, tendem hoje a se endurecer.


Na Europa, foi no terreno eleitoral que a esquerda radical obteve seus maiores sucessos recentes; e também onde sofreu seus mais amargos fracassos. A primeira onda de sucessos eleitorais foi vista acima de tudo na Dinamarca, na Espanha, na Grécia e em Portugal – com o ponto alto da conquista do governo pelo Syriza [na Grécia] e o apoio popular massivo para terminar com as políticas de austeridade (Ntavanellos, 2015; Thornett, 2015; Toussaint, 2015; Udry, 2015). Evidentemente, a primeira lição é que um evento assim notável foi possível. A segunda, infelizmente, foi a traição de seu mandato pela direção [de] Tsipras e sua integração (em uma posição subordinada) à governança autoritária da União Europeia. Depois da esperança, a desilusão [aversão] – e [assim] um ponto de virada negativo para a esquerda radical na Europa. Certamente, o futuro da Aliança Verde-Vermelha na Dinamarca (Voss, 2011), do Bloco de Esquerda em Portugal (Louça & Romero Baeza, 2010) e do Podemos na Espanha (Antentas & Souvlis, 2016; Camargo, 2016; Sabado, 2015a) continuam sendo questões principais, mas agora eles enfrentam um contexto mais difícil.


Outro processo foi iniciado na Grã-Bretanha, com o Momentum e Corbyn. Por mais significativo que isso seja (Socialist Resistance, 2016), não está claro que algo semelhante vá se reproduzir em outro lugar. A Alemanha a experiência já está feita (Die Linke). Na França, foi a criação do Parti de Gauche [Partido de Esquerda] (abandonado por seu criador) e, juntamente com o Partido Comunista Francês, o lançamento da Front de Gauche [Frente de Esquerda] (agora clinicamente morta). Fora isso, resta Jean-Luc Mélenchon. Enquanto isso, o Partido Socialista parece prestes a implodir, sem eco e dinâmica de massas. O mesmo vale para o PSOE na Espanha (Pastor, 2016). Na Itália, o jogo acabou. Em muitos países, a direita extrema e a extrema-direita são as forças que polarizam a raiva popular.


O futuro pode nos reservar novas surpresas agradáveis; mas devemos estar atentos à “lógica hegemônica” do terreno eleitoral e do poder de cooptação das instituições. Onde o sucesso de uma organização é medido pelos resultados das eleições e não pelo progresso de sua implantação social; o sucesso eleitoral não implica automaticamente um avanço do enraizamento local. A sucessão dos prazos eleitorais comanda as prioridades financeiras e devora a atenção das direções. A derrota deixa o rei nu – e os cofres vazios. O sucesso é perigoso. Organizações inteiras – Akbayan nas Filipinas; Syriza na Grécia... – perderam sua alma militantes nas instituições, apesar da feroz resistência interna de minorias partidárias. Outros perderam seus parlamentares, para não perderem sua alma (como o RPM-M nas Filipinas).


Um partido radical deve poder intervir segundo as possibilidades e necessidades em todos os domínios, inclusive no parlamentar e nas institucional, mesmo hostis. O perigo é adaptar a própria concepção do partido “realmente existente” aos jogos eleitorais. É uma boa ideia rotacionar os parlamentares. As regras financeiras (como a remuneração que os membros do parlamento devem receber) devem ser claramente estabelecidas e respeitadas. O enraizamento social deve se fortalecer, e não enfraquecer, ao longo do tempo. Poderíamos aprender muito com as experiências originais recentes. O movimento popular coreano impulsionou a criação do Partido Democrata do Trabalho (KDLP), a confederação sindical KCTU e a Liga dos Camponeses (KPL), representadas diretamente nos seus órgãos de direção (KDLP, 2005). O KDLP teve um verdadeiro sucesso eleitoral, mas foi fortemente reprimido em nome da “segurança nacional”. Além disso, na Coréia do Sul nunca é fácil a coabitação entre a corrente de “libertação nacional” que dão prioridade à questão da reunificação do país e a corrente de “democracia popular” que priorizam as lutas sociais.


A experiência do KDLP é muito especificamente sul-coreana e, portanto, não reproduzível? Provavelmente, mas a questão substantiva do vínculo entre partidos radicais e sua base social continuará sendo colocada.


Na ausência de partidos radicais com uma base de massa, outras correntes sindicais de luta de classes se colocam a questão de fundá-lo. É o que estamos vendo hoje com a NUMSA na África do Sul (Irvin, 2016). No México, o sindicato mexicano dos eletricistas (SME) julgou ser necessário apoiar a criação de uma nova formação política, a Organização do povo e dos trabalhadores (OPT) (Montes de Oca Luna H., Gaudichaud F., Thomas F, 2015) (Sanchez E., 2014; Marquez H., 2011).

Outra experiência recente, na Europa desta vez, é a do Partido Trabalhista Polonês (PPP), que começou a ser construído em 2001 a partir do sindicato livre “Agosto 80” (Malewski, 2009; “Agosto 80”, 2010). Portanto, isso é claramente uma questão atual a se reintroduzir na reflexão internacional.

Os precedentes históricos na África do Sul e no Brasil ilustram como os partidos inicialmente fundados no movimento sindical podem instrumentalizá-lo. Depois de chegar ao governo, foi o que aconteceu no Brasil com o Partido dos Trabalhadores (PT) e a CUT (Antunes, 2014); ou na África do Sul com a ANC e o COSATU (Gabriel, 2014; Numsa, 2014; Amandla!, 2013). É preciso, então, se prevenir.


Por fim, uma das particularidades dos processos europeus contemporâneos é o atraso temporal entre as mobilizações sociais que abriram o caminho para a esquerda radical e os momentos em que os sucessos eleitorais se produzem (Syriza, Podemos...). Consequentemente, a base social organizada do movimento parlamentar (ou do governo, no caso grego) era surpreendentemente estreita em relação à sua audiência eleitoral – um perigoso calcanhar de Aquiles.


A experiência mostra que a resistência às derivas direitistas de direções políticas e sindicais, assim como o alargamento da base social da esquerda radical após um sucesso eleitoral, não são nada espontâneos. Não se pode confiar em uma simples “dinâmica”, na qual a situação seria bem-sucedida. Tudo isso depende de tarefas políticas e de realinhamentos organizativos. Devemos agir fora das instituições, e não somente em seu interior.


Sobre Lênin e o partido


O centenário da revolução de outubro de 1917 é uma oportunidade para relembrar a experiência revolucionária do século XX e revisitar suas lições à luz dos problemas contemporâneos. Com a figura de Lênin, a “questão do partido” se impôs, juntamente com outros não menos importantes.


As observações que se seguem não procuram resumir a história do Partido Socialdemocrata Russo (RSDLP) e do bolchevismo a esse respeito. Nem a história da concepção de partido na teoria marxista. Ainda assim, o “leninismo” se mostrou um ponto de referência útil porque, depois de Marx e Engels, Lênin foi a única referência comum aos partidos comunistas e à maioria das correntes de extrema-esquerda do século XX (maoístas, trotskistas...).


O debate sobre “a” concepção de partido de Lênin muitas vezes se inundou de interpretações simplistas do Que Fazer? (Lênin, 1902; Draper, 1999). No entanto, é preciso levar em consideração o contexto histórico em rápida evolução e elaborar uma interpretação complexa (Le Blanc, 1989; Löwy, 1991) da trajetória militante e intelectual nunca concluída de Lênin (Vercammen, 1989) – assim como é preciso considerar lugar atribuído por Lênin ao político e à relação entre estratégia e tática (Bensaïd, 1997).


Por fim, nossa própria leitura do “leninismo” é marcada pelo contexto do momento e por nossa experiência acumulada. Ela necessita ser regularmente revisitada (ver a introdução de 2008 a Bensaïd e Naïr, 1969).


Contentemo-nos aqui de retomar aqui algumas linhas gerais.


Horizonte estratégico, análise concreta


Lênin é especialmente interessante na maneira como conecta (e não justapõe) a teoria e os objetivos de longo prazo, por um lado, e a consideração do contexto, “a análise concreta da situação concreta”, por outro. No entanto, já vimos como o contexto atual não é favorável à construção dos partidos que necessitamos e que necessitaremos. Isso, ao mesmo tempo, faz com que tenhamos de conduzir uma reflexão estratégica de fundo. É possível avançar neste âmbito sobre questões importantes como a do “sujeito revolucionário” – e muito já foi feito a este respeito. Todavia, em vários países é impossível responder hoje a outras questões, tais como “como desarmar a burguesia?”. Portanto, devemos construir a longo prazo, apesar da existência de “pontos cegos estratégicos”, analisando a experiência histórica contemporânea para alimentar o nosso pensamento estratégico.

Um partido delimitado e militante


Um partido não deveria ter fronteiras nem exigências na era da Internet e da militância “à la carte”? Deveria ser “fluido”, de acordo com um capitalismo que é também “fluido”? A dominação de classe é fluida? O ataque ideológico cotidiano é fluido? O Estado de segurança é fluido? Os ditames da dívida, da União Europeia, das intervenções imperialistas são fluidos? A violência da guerra de classes se tornou líquida de repente? Estas questões são o que notavelmente determina se é necessário um partido delimitado, no qual os membros são ativos nas estruturas militantes.


A revolução não é um “ato único” (a famosa Grande Noite), então um tal partido deve ser um “elemento de continuidade nas flutuações da consciência coletiva”. Ele permite refletir sobre “a representação do social na política”, ele é “a forma específica sob a qual a luta de classes se inscreve no campo político” (Bensaïd, 1997). O fato de ser constituído por militantes o permite ser enraizado nas camadas populares, com uma relação e um vínculo orgânico com os movimentos sociais.


Um partido para a ação política em toda a sociedade


Um partido revolucionário não confina sua ação ao local de trabalho, ao “face a face” direto entre um patrão e seus assalariados. Ele “representa” a classe trabalhadora, não apenas em relação a um determinado grupo de empregadores, mas diante de “todas as classes da sociedade contemporânea e do Estado enquanto força política organizada” (Lênin, 1902, p. 408). Os exemplos fornecidos anteriormente sobre os partidos “úteis” de hoje ilustram a atualidade e a importância desta questão em um contexto que favorece a fragmentação das lutas.


Um partido reativo


Um partido capaz de perceber a emergência do novo e de se reorganizar de acordo, seja em termos de implantação social (exemplo atual: a emergência do precariado nos países europeus) ou em resposta a uma mudança brutal na situação política. Um partido capaz também de responder ao imprevisto – porque o imprevisto existirá sempre. Sem ser “fluido”, um partido deste tipo deve ser flexível...


Pensar o novo implica não ser prisioneiro dos debates de ontem e ser capaz de um retorno crítica sobre suas próprias posições (Joshua, 2015). Ler uma conjuntura nova através do prisma de polêmicas anteriores é um dos melhores modos de perder uma oportunidade, uma “bifurcação” possível. Isso pode custar muito caro.


Continuidade e conservadorismo


A construção de um partido, como de toda organização popular, é um processo de acumulação de forças sociais, políticas, culturais e organizacionais... Tal processo exige continuidade e seu aprofundamento na atividade. Portanto, ser reativo não significa se recolher e só se colocar de modo efêmero.


Toda organização também é conservadora. Tende a recrutar de acordo com a sua imagem e a funcionar segundo códigos implícitos que refletem sua composição inicialmente majoritária. Isso torna difícil integrar efetivamente membros que não estão em conformidade com essa “norma” dominante: as mulheres em movimentos dominados por homens, os assalariados sem diploma universitário (mesmo que um grande número de trabalhadores de baixa renda possa ter sido estudante), os precários, os imigrantes, etc. O problema é particularmente agudo a nível de órgãos de direção com comportamentos frequentemente excludentes, “familiares” (uma família por vezes dividida).


A política de construção da organização deve, portanto, incluir uma reflexão sobre o peso de seus conservadorismos e as medidas que reforçam sua capacidade de acolhimento, de formação e de integração, dando ênfase para o funcionamento coletivo (Duggan, 1997). Isso é muito mais que uma questão de cotas – e mais fácil de dizer do que fazer, precisamente porque boa parte do problema depende do implícito, de um estado de espírito, de códigos informais.


Um partido que pode fornecer uma orientação geral [de conjunto] (veja acima), elementos de estratégia e, depois, uma estratégia apropriada (em relação às características do período) quando o nível das lutas permite.


Também aqui, isso implica uma política de desenvolvimento da organização que lhe permita se enraizar nos setores sociais em que está ausente. Não há nada de espontâneo neste âmbito. Claro, quanto mais um grupo for numericamente frágil, menos ele pode se desenvolver neste sentido.


Um partido capaz de pensar as mediações concretas, as formas de organização transitórias em função da relação entre o necessário e o possível, tendo em consideração as consciências e a herança das lutas anteriores.


Em muitos países, as condições realmente existentes não permitem a construção “do partido revolucionário”. O desafio é então o de suscitar ou participar da constituição de formações políticas, digamos, híbridas – que expressem a experiência contemporânea, permitindo agir sobre o presente, elevar o nível de consciência, acumular forças, fazer avançar. Fazer isso evitando que tais formações políticas se ossifiquem e deem origem a novos reformismos impotentes.


Estes movimentos “híbridos” podem se mostrar temporários; entrarão em crise, mas não sem ter fornecido uma experiência necessária. Podem assim dar origem a organizações mais duradouras e renovadas da esquerda radical.


Em relação às concepções de partido e de “leninismo” que carregamos, há três desenvolvimentos ou esclarecimentos particularmente dignos de nota.


O "resto" não segue


Contribuímos a veicular uma visão muito simplista da revolução russa: o proletariado toma o poder e o restante da população trabalhadora o segue. Isto é historicamente falso, dado o que aconteceu com o campesinato e as nacionalidades em 1917. Diga-se de passagem, um dos fracassos do bolchevismo foi não ter se implantado entre o campesinato antes de 1917 e nem pensado cedo o suficiente sobre as condições para uma convergência duradoura entre operários e camponeses – e, no entanto, esta era uma questão da primeira importância (Rousset, 2013a). O mesmo pode ser dito sobre o papel específico dos movimentos de mulheres para manter e aprofundar a dinâmica revolucionária.


Pluralismo radical


Um bom exemplo de reavaliação é a maneira como aplicamos a noção de pluralismo ao próprio movimento revolucionário, e não mais apenas aos partidos operários (reformistas, centristas...), rompendo com a fórmula tradicional em nossas fileiras: “os partidos operários, um partido revolucionário”. De fato, a experiência revolucionária é complexa demais para autorizar a ideia de uma só síntese integral e de sua encarnação em um único partido. Este pluralismo revolucionário pode ser expresso de diversas várias maneiras (pluralidade de partidos, coalização permanente, correntes no interior de um partido composto), mas isto não é passageiro – veio para ficar.


Nada está garantido, jamais


Para nossos partidos, a afirmação e a integração do feminismo têm sido particularmente importantes porque se refere diretamente a metade da humanidade (e dialeticamente à outra metade também) e porque ele tem um grande impacto em todas as áreas – da teoria e do programa à política ou a vida cotidiana (com um alcance mais “íntimo” do que outras questões que também têm implicações sobre os “modos de vida”: ecologia, crítica da ordem mercantil, etc.


No entanto, em muitos casos (há belas exceções) o feminismo passa facilmente ao segundo plano, ou é visto mais uma vez como “divisor” (uma velha alegação!). Os qualificativos de anticapitalistas e antirracistas raramente são esquecidos. A referência ecossocialista já tem tido dificuldade de se impor – mas a afirmação do perfil feminista se faz de maneira fortemente ocasional. Em outros lugares, para uma ala do antirracismo político, o antissexismo não merece (na melhor das hipóteses) mais do que uma posição subordinada; e aqueles que buscam articular as duas exigências são vistos com maus olhos.


Por fim, o comportamento sexista dentro de organizações radicais – envolvendo particularmente as direções – continua a servir e a provocar graves crises, como a do Socialist Workers Party (SWP) [Partido Socialista dos Trabalhadores] britânico. Portanto, devemos evar em consideração a fragilidade das “conquistas” neste tipo de domínio e tomar medidas para evitar o seu enfraquecimento.

Se as militantes de organizações de extrema-esquerda puderam desempenhar um papel de impulsionamento no desenvolvimento da segunda onda do feminismo, isto se deu especialmente porque sua experiência no seu interior as convenceu da necessidade de um movimento de mulheres autônomo. Agora estamos pagando o preço pelo enfraquecimento destes movimentos em vários países.


Reconhecimento mútuo de autonomia


A crítica explícita das relações hierárquicas entre partidos e movimentos sociais representou um esclarecimento particularmente bem-vindo (Crémieux, 2003). Nossa temos como “linha de marcha” a auto-emancipação popular e não o “comandismo” (dirigismo) vertical da vanguarda autoproclamada, do partido de governo ou de sua fração parlamentar (ver o caso do Partido Trabalhista britânico).


Houve momentos chave na história em que a criação sociológica de uma classe operária de primeira geração, a formação dos sindicatos e o desenvolvimento de um partido comunista andaram de mãos dadas (o sul da China em meados da década de 1920 é um exemplo clássico). Mas, mesmo nesses casos, o processo de auto-organização no quadro de uma crise revolucionária e o de constituição de um partido são de natureza distinta. A classe não se representa em um partido revolucionário; as mulheres não se representam em um partido feminista; as populações “racializadas” não se representam em um partido “racializado”; a nação não se representa em um partido nacional, seja comunista ou não (para o caso do Vietnã, ver Rousset, 1982)... Quando os partidos referidos pretendem o contrário, eles manipulam, manifestando suas tendências substitucionistas. Os partidos não são quadros de auto-organização (diferente de verdadeiros comitês locais, etc.).


Quanto aos partidos e movimentos sociais, eles estão “lado a lado” e não “em cima e em baixo”. O político não é estranho ao movimento social, o combate deste é político naquilo em que ele ataca a dominação capitalista – esta é a base de um diálogo possível e necessário entre partidos radicais e movimentos, a base para lutas e iniciativas comuns. A condição primeira para este diálogo é um reconhecimento mútuo de autonomia assim como de objetivos comuns.


Estes interesses e objetivos comuns não param de aumentar. Não se trata apenas de defender com unhas e dentes os direitos sociais e ambientais. Estamos vivendo na era da crise ecológica, do crepúsculo da democracia política e do judiciário, do estabelecimento de um sociedade de segurança e de regimes de exceção permanente. De exacerbação das opressões. Em uma situação como esta, é tempo de refundar um bloco de resistência e de alternativas que inclua partidos de combate e movimentos populares radicais.


– Tradução feita a partir da versão em inglês. Revisão feita com base na versão francesa (original).



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