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Nossa revolução russa (Charles Michaloux e François Sabado)


Nossa revolução russa

Charles Michaloux e François Sabado

Tradução de Marcia Benaduce

Revisão de Pedro Barbosa


O centenário da Comuna de Paris, em maio de 1971, em Paris, foi marcado por uma grande marcha na qual a energia muito recente de Maio de 68 flutuava no ambiente da primavera parisiense, diante do cemitério do Père-Lachaise e do Muro dos Federados. Era a celebração de um evento fundador, mas que acabou em derrota. Embora a lembrança do massacre dos comunardos pelas forças de Versalhes e pela burguesia parisiense fornecesse a este centenário todo o seu peso, estava impregnado pela feliz esperança da juventude que saiu às ruas naquele dia.


O centenário da Revolução Russa se apresenta de uma maneira muito diferente. No entanto, Outubro de 1917, ao contrário da Comuna de Paris, terminou com uma vitória: uma vitória prolongada, brilhantemente conquistada contra o cerco contrarrevolucionário de todas as grandes potências da época. Mas, após a desvastação do stalinismo, a implosão da União Soviética se deu sem que este colapso brutal reavivasse a memória de Outubro. Não está prevista nenhuma mobilização (comemorativa) e atualmente, após uma década de crise na qual se sente cada vez mais a violência de um capitalismo sem fronteiras, o espírito do tempo começa a pesar. O centenário é aproveitado para fazer propaganda da nocividade e inutilidade desta revolução que terminou em ditadura, ou dar a entender que desde o seu nascimento ela foi o instrumento desta última, graças ao golpe de Estado.


Neste artigo, tomamos partido em defesa da Revolução Russa como um grande evento na história da emancipação dos povos, um momento incomum em que as classes dominantes perderam o controle que esperavam ter nos séculos futuros, aquele em que as massas populares arrasaram com tudo para tomar as rédeas de seu destino. Estamos convencidos de que a resposta à decisiva pergunta histórica e teórica sobre se era necessário tomar o poder nas condições precisas de outubro de 1917 segue sendo sim. O impulso da mobilização antes, durante e após Outubro de 1917, o entusiasmo que gerou e o choque que causou no mundo inteiro mostram o alcance dessa revolução. “Concretamente, o que poderá trazer à luz os tesouros das experiências e dos ensinamentos não será uma apologia cega, mas uma crítica penetrante e reflexiva. (...) Pois uma revolução proletária exemplar e perfeita em um país isolado, esgotado pela guerra mundial, estrangulado pelo imperialismo, traído pelo proletariado internacional, seria um milagre. O que importa é distinguir, na política dos bolcheviques, o essencial do acessório, o substancial do fortuito”, escrevia Rosa Luxemburgo em suas notas de prisão sobre a Revolução Russa.


Diante de uma burguesia russa que, em ziguezague durante os diferentes estágios da mobilização revolucionária, lutava para que a guerra continuasse, para que o campesinato permanecesse sem terra e para que as duras condições de vida dos operários não mudassem, os bolcheviques optaram pela organização independente do movimento nos sovietes e acompanharam o aprofundamento do movimento indicando-lhe os objetivos que o afastava de qualquer conciliação até conseguir derrubar o governo através da insurreição que daria “todo o poder aos sovietes”. Mas o que era (ou podia parecer) acessório no curto período após a revolução se mostrou mais tarde algo fundamental; de qualquer forma, assim foi apresentado não apenas pelos adversários da revolução, mas também por seus principais atores, na década de 1920.


As circunstâncias explicam uma série de erros ou de desvios: uma revolução proletária em um oceano camponês, uma guerra civil de uma crueldade insana, o esgotamento das forças produtivas e de toda a sociedade, o isolamento internacional, a história do país e a sua carência de tradições democráticas. Mas estas circunstâncias não explicam tudo. Os bolcheviques – e, em sua direção, os mais eminentes entre eles, Lenin e Trotsky – fizeram da necessidade virtude e transformaram as medidas de exceção da guerra em leis e regras de funcionamento do Estado e da sociedade. A oposição e a vida democrática do país foram sufocadas de forma progressiva e rápida (em apenas alguns anos). Portanto, é necessário reavaliar a política impulsionada nos primeiros anos da Revolução por Lenin e Trotsky neste âmbito. Já que este foi o terreno fértil em que a contrarrevolução stalinista, uma vez “congelada” a revolução (como dizia Saint-Just da francesa), pôde acabar com o que ainda restava da herança viva de Outubro.


Em nosso entendimento, este enfoque se inscreve de maneira deliberada na continuidade das reflexões críticas de Rosa Luxemburgo desde os primeiros meses que se seguiram à tomada do poder (vejam-se suas Notas sobre a Revolução Russa), da defesa de Ernest Mandel da “legitimidade da Revolução Russa” [1] e do balanço crítico [2] de Daniel Bensaïd em 1997.


Hoje em dia nos parece importante sistematizar e dar forma a este balanço crítico, mais do que já o fizeram Mandel e Bensaïd. Mesmo assim, o pano de fundo desta reflexão segue sendo o mesmo: a Revolução Russa é a primeira revolução proletária vitoriosa da história. O que ela alcançou continua sendo uma inspiração viva; neste marco, a ação das mulheres e homens que tiveram esta audácia merece um exame crítico, por respeito às suas realizações e pela vontade de extrair delas as melhores lições possíveis. Toda revolução terá que lidar com estas questões, como já indica a forte sensibilidade democrática em todas as mobilizações de uma certa amplitude.


Revolução e insurreição


Golpe de Estado? A insurreição foi ao mesmo tempo a culminação da revolução iniciada em fevereiro e o ponto de partida de uma nova situação revolucionária. De qualquer forma, não foi um golpe de Estado! Preparada e debatida abertamente, a insurreição foi o ponto culminante de um processo de radicalização das massas e de sua representação nos sovietes que – tropeçando em função dos acontecimentos que sacudiam a Rússia – deram a maioria àqueles que defendiam a tomada do poder pela sovietes. A insurreição de outubro não foi uma operação tramada por círculos político-militares sem a intervenção ou pelas costas das massas. Deste ponto de vista, a referência a Blanqui não é mais justa do que a caracterização como “golpe de Estado”.


Se deu com dificuldades e choques, inclusive no interior do partido bolchevique. Mas quando se reuniram as condições, no final de setembro, surgiu um debate mais avançado.


Lenin, que já tinha lutado arduamente para chegar a um acordo sobre a perspectiva da tomada do poder, desconfiava das tergiversações que, a seu ver, não tinham outra função senão atrasar os prazos. Assim, ele defende ir rápido, e exige que os regimentos e batalhões da frota e tropas da Finlândia, fiéis aos bolcheviques, sejam lançados ao assalto do Palácio de Inverno, para derrubar o governo provisório de Kerensky. Ele se dirige à liderança do partido sem ambiguidade: “Os bolcheviques devem tomar o poder”. Trotsky, que resistia aos seus comandos cada vez mais insistentes, enfatiza a necessidade de que a insurreição, isto é, a tomada do poder, emane da legalidade soviética. Zela para que o soviete de Petrogrado – do qual foi nomeado presidente – seja dotado de um Comitê Militar Revolucionário (CMR) ao qual respondam os sovietes de soldados, que representam um exército em plena efervescência revolucionária. E é o CMR que organiza a insurreição na noite de 25 a 26 de outubro (em nosso calendário, é o que acontece de 6 a 7 de novembro).


A divergência entre Lenin e Trotsky se refere a uma questão mais substancial do que o simples caráter “técnico” da insurreição, sobre cuja necessidade estavam de acordo. Evidentemente, toda organização insurrecional exige preparativos militares específicos e segredos de conspiração. Tudo isto foi levado a cabo com perfeito domínio pelo CMR dirigido pelos bolcheviques, com Trotsky à frente. Os centros nevrálgicos do poder (correios, comunicações, quartéis) foram rapidamente ocupados pelos batalhões revolucionários. Como sabemos, a tomada do Palácio de Inverno, sede do governo provisório, foi um pouco mais lenta devido a uma menor organização.


Este episódio, que em certo sentido é o primeiro do novo poder, é bastante revelador de certos problemas que serão agravados mais tarde com as terríveis dificuldades da guerra civil.


Lenin vê os sovietes como uma máquina para a destruição do czarismo, de seu Estado, de todas as suas instituições e como o instrumento de mobilização das massas contra o czarismo e contra o governo provisório. Deste ponto de vista, os sovietes também eram um organismo de frente única para derrubar o poder estabelecido. Daí as consignas de Lenin a favor de “todo o poder para os soviéticos” e a pressão para que os mencheviques e socialistas-revolucionários [SRs] constituíssem um governo de ruptura com a burguesia, apoiado pelos sovietes. Nesta situação revolucionária, anterior à conquista do poder, com um partido bolchevique minoritário, a democracia soviética ocupava um lugar importante, com seus distintos componentes (correntes, partidos, sindicatos). Mas confrontado com os problemas táticos e estratégicos da tomada do poder (quem toma o poder?), Lenin relega a auto-organização a um segundo plano, e confia apenas na direção militar bolchevique. Não se concebem mais os sovietes como o verdadeiro lugar do poder, mas como o instrumento, ou mesmo como a “cobertura” do poder bolchevique.


Trotsky tem outra maneira de proceder. Seu papel na revolução de 1905, à frente do Soviete de São Petersburgo, sua imagem como defensor da unidade no movimento revolucionário russo, levaram-no a dar um lugar mais central à auto-organização popular; daí a sua insistência com relação à tomada de poder pelo CMR. A força da dinâmica soviética, mas principalmente Trotsky e os principais dirigentes bolcheviques, obrigaram Lenin a passar pelo CMR e pelo soviete para dirigir a insurreição. No coração mesmo da insurreição se expressa este problema crucial: quem toma e quem tem poder? Os sovietes ou o partido? É assim que se levanta de partida a questão de um certo substitucionismo (do Partido em relação aos órgãos revolucionários).


O paradoxo do Estado e a revolução


Uns meses antes das jornadas de Outubro, Lenin se vê empurrado para a clandestinidade pela repressão que se segue às jornadas de julho. Em seu exílio forçado, volta aos textos de Marx e Engels, especialmente sobre a Comuna de Paris. Em agosto de 1917 finaliza “O Estado e a revolução”. Este texto fundamental é uma crítica ao líder alemão da social-democracia (Karl Kautsky) e seus seguidores na Alemanha e na Rússia. Voltando aos fundamentos, ele apresenta uma fórmula frequentemente surpreendente da necessidade de destruir a velha máquina burocrática e militar do Estado, a fim de construir um novo governo, uma nova administração e um novo exército – cujo objetivo é transformar de cima a baixo a sociedade e cuja função desde o momento da sua criação é definhar. Seguindo e citando Marx, Lenin vê na Comuna “a forma política enfim encontrada” deste empreendimento revolucionário: “A Comuna é a forma enfim encontrada, pela revolução proletária, sob a qual a emancipação econômica do trabalho pode ser alcançada” (Lenin, O.E., p. 169). “A Comuna é a primeira tentativa da revolução proletária de destruir a máquina estatal burguesa e a forma política, enfim descoberta, que pode e deve substituir o que foi destruído” (ibid). E Lenin conclui que “as revoluções russas de 1905 e 1917 continuam, em outras circunstâncias, sob condições diferentes, a obra da Comuna e confirmam a genial análise histórica de Marx” (ibid, p. 171).


O paradoxo é que este texto, escrito três meses antes da tomada do poder, embora seja muito eficaz para colocar por terra as pseudo “teorias marxistas ortodoxas” da época – que justificavam para os social-democratas alemães ou os mencheviques russos a perspectiva de se moldar ao Estado burguês –, não diz nada sobre questões específicas de democracia e representação política em um regime de transição entre o capitalismo e o socialismo. Endossando a profissão de fé de Engels no Anti-Dühring (“o governo das pessoas cede lugar à administração das coisas e à direção das operações de produção”), O Estado e a revolução arrasa com força as velharias reformistas de adaptação à sociedade burguesa e seu Estado repressivo; no entanto, não diz nada sobre o debate político propriamente dito, ou sobre o pluralismo de opiniões e de correntes organizadas para defendê-las. Em suma, a política não é abordada como tal, como se ela também tivesse que definhar após a revolução.


Assim, o paradoxal é que o autêntico sopro revolucionário que percorre esta obra parece ao mesmo tempo defasado com relação à realidade das intensas lutas políticas que estão ocorrendo na Rússia (e nos próprios partidos operários) e com relação àquela que vai se abrir após a tomada do poder.


Mas o que Lenin deixa de abordar em relação à democracia socialista que a revolução deve colocar na agenda, sob circunstâncias e decisões alheias ao argumento central de O Estado e da revolução, será carregado com outro conteúdo realmente diferente.


Este beco sem saída tem uma dupla origem: a ausência de tradições políticas democráticas e até parlamentares na Rússia antiga, combinada com a concepção dominante na Segunda Internacional de que a social-democracia era a expressão orgânica da classe trabalhadora e do movimento operário, e na qual o movimento sindical é considerado subordinado ao partido. As tendências existiam, mas dentro de um só e mesmo partido: a social-democracia. No movimento operário, o multipartidarismo não fazia parte da cultura da época: uma só classe, um só sindicato, um só partido. No entanto, a luta entre tendências e frações eram extremamente agudas, especialmente na Rússia, inclusive no partido bolchevique de março a outubro de 1917. As coisas mudariam progressivamente depois da conquista do poder.


A virada dos anos 20 e a asfixia democrática


Tanto na cidade como no campo, a economia estava muito desorganizada e a classe trabalhadora terrivelmente debilitada. O exército estava amplamente decomposto devido à mobilização dos soldados. A administração, mais do que reticente diante do poder dos sovietes, fazia tudo o que podia para não fazer nada. Rapidamente, a situação tomou um rumo dramático.


A primeira questão espinhosa foi acabar com a guerra sem travar o desenvolvimento da revolução, há muito esperada na Alemanha e na Europa. Neste sentido, o partido bolchevique se viu dividido por fortes discussões, assim como as outras correntes presentes nos sovietes, como os mencheviques, os socialistas-revolucionários [SRs], os anarquistas. Esse debate impediu encerrar imediatamente [a guerra], como desejava Lenin, que defendia com realismo a aceitação das exigências alemãs. Alguns meses depois, o exército alemão penetrava profundamente no território russo. E o Tratado de Brest-Litovsk, assinado em março de 1918, ratificou a amputação de um quarto do território russo e de sua população, bem como a perda de 70% dos recursos agrícolas e siderúrgicos. Uma verdadeira sangria que, sem dúvida, poderia ter sido evitada ou reduzida por uma decisão mais rápida. Mas assim que foi assinado, o tratado provocou a saída dos mencheviques internacionalistas e dos SRs de esquerda dos organismos soviéticos, para denunciá-lo. Alguns setores dos SRs adicionaram também o retorno ao terrorismo contra os dirigentes bolcheviques (Volodarski foi assassinado em Petrogrado em junho de 1918).


Desde o final de 1917, uma maioria da direção impôs a Lenin (que não queria) a entrada dos chamados mencheviques internacionalistas e dos SRs de esquerda (ambos em dissidência com a orientação conciliadora de sua direção) nas instâncias do novo governo. Assim, sua presença durou pouco. Mas este clima, que achamos tão difícil de imaginar agora, tem muito a ver com as propensões monolíticas que posteriormente se tornariam mais agudas. As tergiversações e a falta de maturidade reveladas no debate sobre a paz custariam muito caro no final. E a inconstância política dos mencheviques e dos SRs de esquerda (os SRs de direita rapidamente se juntaram à contrarrevolução) também não ajudou a reduzir a tentação de governar sozinhos. Especialmente considerando que a guerra civil e a intervenção estrangeira franco-britânica começaram muito rapidamente, no outono de 1918.


As circunstâncias desempenharam o seu papel, mas durante todo esse período os bolcheviques não tiveram uma política orientada para a construção de coalizões que traduzissem as correlações de forças políticas do país. Os bolcheviques eram majoritários nos sovietes das principais cidades. O que não era o caso no campo, onde a tradição populista (narodniki) e os socialistas-revolucionários [SRs] eram amplamente majoritários. Além disso, subsistiam correntes e sensibilidades dos partidos da democracia revolucionária, mencheviques, SRs e anarquistas. A questão das alianças ou coalizões governamentais foi levantada desde a tomada do poder, apesar da desconfiança ou oposição de Lenin. Lenin e Trotsky nunca teorizaram o poder de um único partido... mas, uma vez conquistado o poder, não tiveram uma abordagem unitária, como diríamos agora. Pelo contrário, Lenin chegou ao ponto de declarar em maio de 1918: “Agora que o poder foi conquistado, conservado e consolidado nas mãos de um só partido, não há necessidade de compartilhá-lo”.


É claro, tinha que se combater, reprimir e condenar aqueles que pegavam em armas contra a revolução. Mas e o resto? Tinham que ser encontrados os meios e mediações para que pudessem encontrar o seu lugar no poder soviético, na medida em que se inscreviam no projeto revolucionário. Esta rejeição da representação política pluralista não apenas isolará os bolcheviques, mas os levará a usar cada vez mais métodos administrativos, repressivos e, por fim, o terror em relação a outros partidos e correntes políticas.


A guerra civil e a luta encarniçada contra o exército branco e seus aliados estrangeiros colocaram o país de joelhos. Durante o ano de 1920, se vence a prova porque as forças sociais que se enfrentam nesse combate cruel discernem perfeitamente seus vínculos e interesses. Os camponeses não queriam dar suas terras aos grandes proprietários, e os operários se recusavam a perder o controle de sua produção, apesar de tanto a terra quanto a produção industrial estarem asfixiadas. Nesta tormenta, os bolcheviques teorizarão uma transição ao socialismo identificada com o comunismo de guerra. A política, a economia e a sociedade deviam ser centralizadas ao máximo. Trotsky não deixou de defender então a militarização do trabalho e dos sindicatos. Felizmente, Lenin se recusou a segui-lo por este caminho.


Uma vez vencida a guerra, levantou-se a questão da saída do comunismo de guerra (com as expropriações no campo e as milícias nas fábricas para forçar a produção). Um ano antes da adoção da Nova Política Econômica (NEP), Trotsky, retornando de suas concepções ultra-centralistas, propôs realizar esse giro. Confrontado com a resistência de Lenin e da maioria da direção, teve que esperar até março de 1921 para que os problemas se agravassem, emergindo todos ao mesmo tempo. As revoltas no campo eram numerosas (às vezes dirigidas por anarquistas como Makhno na Ucrânia), e a atmosfera era melhor apenas nas fábricas, onde os sovietes ainda sobreviviam no papel. A revolta dos marinheiros de Kronstadt veio para completar um quadro catastrófico. “O relâmpago iluminou a realidade de maneira mais vívida do que qualquer outra coisa”, disse Lenin no 10º Congresso Bolchevique que ocorreu neste mesmo período. A conclusão que será tirada disso não deixa de levantar sérias questões.


A NEP estava absolutamente justificada pela necessidade de relançar a indústria – inclusive com investimento estrangeiro –, assim como a produção agrícola dando o controle dela a um campesinato que pagasse impostos. Mas a melhor proteção contra as derivas subsequentes da NEP (o rápido enriquecimento de certos kulaks, camponeses médios e comerciantes) residia, sem dúvida, em um regime reativado de abertura política, paralelo à abertura econômica. Uma NEP política para todos os partidários da revolução, após a vitória sobre a contrarrevolução interna e externa. Isto teria estimulado o renascimento da vida política, soviética, sindical e associativa, que teria visto no ressurgimento de seus direitos uma motivação para acompanhar a reativação da economia e do país.


Mas o que foi iniciado foi o oposto. Em primeiro lugar, por causa da terrível repressão contra os marinheiros e trabalhadores de Kronstadt. Quaisquer que fossem os riscos que estes últimos oferecessem à revolução ao se sublevar, a violência desta repressão não tem justificativa. Em segundo lugar, devido a um processo de repressão molecular que se estendeu por todo o país, como Boris Souvarine aponta. E, finalmente, pelas decisões do 10º Congresso Bolchevique, que asfixiariam o debate político no partido e no país. A proibição de tendências e frações no interior do partido, já transformado em comunista, respondia sem dúvidas ao medo de um rompimento ou explosão após as crises que o atravessaram. O remédio foi, evidentemente, pior que a doença. Além disso, ele ratificou – fora do partido e para toda a sociedade – o monolitismo de um único partido que acompanhavam tais medidas disciplinares.


No final da década de 1920, quando Stalin e a burocracia germinada a partir dessas regras sangraram o partido, não lhes será difícil encontrar justificativas leninistas, as quais Lenin questionou no final de sua vida e que Trotsky começou a denunciar tarde demais.


Este balanço crítico no campo das liberdades políticas não estaria completo sem considerar a questão do terror e seu instrumento, a Tcheka. Todas as revoluções tiveram que enfrentar projetos contrarrevolucionários que usam todos os meios violentos à sua disposição. Aos quais devemos responder. Em sua História Socialista da Revolução Francesa, Jean Jaurès descreveu coisas assim: “Quando um país luta ao mesmo tempo contra as frações internas e contra o mundo, quando a menor dúvida ou o menor erro pode comprometer, talvez por séculos, o destino da nova ordem, aqueles que dirigem esse imenso empreendimento não têm tempo para incorporar os dissidentes, para convencer seus adversários. Eles não podem deixar muito espaço para o espírito de debate ou o espírito de artimanha. Eles têm que derrubar, têm que agir e, para manter intacta sua força de ação, para não dissipá-la, pedir à morte que estabeleça ao seu redor a unanimidade imediata de que necessitam”.


O problema então é distinguir entre as medidas de exceção que infelizmente são necessárias e o uso de tais medidas como meio permanente de governo. Contudo, Lenin não tarda em exclamar, em janeiro de 1918: “Enquanto não usarmos o terror contra os especuladores, fuzilando-os imediatamente, nada mudará!”. Declaração intempestiva que levará o SR de esquerda Isaac Steinberg a perguntar inocentemente por que ele havia sido nomeado Comissário do Povo para a Justiça. Os desvios eram de fato numerosos para esses tchekistas vestidos de couro que acreditavam ser a ponta de lança da revolução (revolução na qual nem todos haviam participado). Um líder bolchevique da Tcheka, Latsis, escreverá friamente em uma ordem de missão: “A questão que está na ordem do dia é saber a que classe social pertencem, sua origem, educação, profissão. Seu destino se decide com base nisso”.


Na época, o uso do terror foi justificado tanto em termos de princípio (“instrumento da ditadura do proletariado”) quanto em termos de reação circunstancial (“na guerra como na guerra”). A verdade obriga a dizer que os protestos contra este estado de coisas, e houve muitos, foram colocados de lado como se fossem escrúpulos pequeno-burgueses. Em um clima em que se desprezava o pluralismo com sarcasmos em nome da luta de classes, estes desvios não deixaram de corromper profundamente os ideais da revolução, e sobretudo os autores de tais condutas. Mais tarde, eles serão mais facilmente recrutados para as tropas de choque do stalinismo.


Acreditando, provavelmente de forma sincera, que tudo isso era necessário dadas as duras circunstâncias, os dirigentes bolcheviques não voltaram a abordar explicitamente o que aconteceu, o que nos deixa com uma herança que hoje preferiríamos não ter. Lenin não fez um balanço crítico até pouco antes de sua morte. Trotsky vai esperar muito tempo. É verdade que as plataformas da Oposição exigiam a restauração da liberdade de discussão no partido, mas não se pronunciavam sobre a liberdade das demais correntes.


Em 1936, em A Revolução Traída, Trotsky escreveu sobre as medidas do 10º Congresso de 1921, quinze anos antes: “A proibição dos partidos de oposição produziu as frações; a proibição das frações levou à proibição de pensar de modo diferente do chefe infalível. O monolitismo policial do partido resultou em impunidade burocrática, que, por sua vez, se tornou a causa de todas as variantes de desmoralização e de corrupção” (p. 75).


Em 1938, no Programa de Transição, ele dizia: “É impossível democratizar os sovietes sem legalizar os partidos soviéticos. Os operários e camponeses devem indicar, por meio de seu voto, quais partidos eles reconhecem como soviéticos” (Edit. Traficantes de sonhos, Madri, p. 66). Isso supõe implicitamente o direito de existência, reunião e expressão para as organizações e correntes políticas que desejam se candidatar às eleições. E a organização de eleições livres. Se tivesse sido assim na União Soviética de Lenin e Trotsky na década de 1920, logo após a vitória sobre os Brancos, não há dúvidas de que haveria mencheviques, socialistas-revolucionários, anarquistas e talvez outras forças representadas.


Podemos acrescentar que hoje sabemos melhor do que antes que os votos populares podem ir para correntes que não se identificam com o socialismo, ou para as quais a palavra é apenas uma capa que esconde outras quinquilharias. Este tipo de problema já surgiu durante as eleições para a Assembleia Constituinte da Rússia, no final de 1917. Vale a pena voltar a abordar isso.


A Constituinte, as eleições e a democracia socialista


Contra as acusações de “putschismo” (golpismo) ou “blanquismo” que já estavam florescendo contra os bolcheviques, Lenin exclamou em maio de 1917: “Não queremos sequestrar o poder, pois toda a experiência das revoluções nos ensina que um poder só está solidamente estabelecido quando é apoiado pela maioria da população”. De fato, essa maioria, na classe operária e no campesinato, mas também em parte da pequena burguesia urbana, foi conquistada ao longo dos meses. Manifesta-se brilhantemente em setembro de 1917, quando a maioria dos sovietes das principais cidades da Rússia oscila a favor dos bolcheviques. É então que a questão da tomada do poder é levantada e debatida abertamente.


Mas, no início de fevereiro de 1917, a luta contra a autocracia czarista havia adotado a bandeira da convocação de uma Assembleia Constituinte, que era ainda mais urgente após a abdicação de Nicolau Romanov e a sucessão de governos provisórios até o último, presidido por Kerensky. Além disso, suas dúvidas e indecisões se refugiavam regularmente atrás do futuro dominado pela chegada da Constituinte. As eleições que conduziriam a ela foram adiadas repetidamente devido a diferentes eventos. E em um país como a Rússia, cuja extensão é a de um continente, em plena guerra mundial, a organização do escrutínio levou meses. Mas esta assembleia foi finalmente eleita e refletiu mais a situação de fevereiro a março do que a de setembro a outubro de 1917. “Este estado de coisas nos permite entender até que ponto a constituinte ficou para trás em relação ao desenvolvimento da luta política e das mudanças alcançadas na correlação de forças entre os diferentes partidos”, diz Trotsky neste momento, defendendo então a decisão tomada de dissolvê-la.


Vale a pena ressaltar a composição da assembleia eleita. Os bolcheviques representam mais ou menos um quarto, os mencheviques quase nada (3%), a direita (cadetes) 10%, os partidos nacional e muçulmano 22%; no final, a maior fração é a dos SRs (levando em conta na mesma lista os de direita e os de esquerda), com 41%. Uma eventual aliança, feita após uma nova eleição, entre bolcheviques, mencheviques internacionalistas e SRs de esquerda (ou seja, favoráveis à revolução), bem como pelo menos uma parte das correntes “nacionais e muçulmanas”, não parece ser uma aposta tola.


Muitos testemunhos da época, incluindo parte dos adversários da revolução, atestam que a dissolução da Assembleia Constituinte não causou uma grande perturbação. Mas esse não é o problema. As descrições feitas do desajuste entre a situação russa e o resultado dessas eleições prolongadas não são questionáveis. O que é, é a ausência de uma alternativa apresentada pelos dirigentes revolucionários diante deste beco sem saída democrático, quando eles próprios haviam defendido com entusiasmo esta perspectiva durante muito tempo.


Tudo ocorre como se, a partir de então, após a insurreição vitoriosa e a tomada do poder, todas as manifestações eleitorais gerais, exceto a renovação periódica da representação nos diferentes sovietes, fossem consideradas supérfluas. De certa forma, esta Constituinte finalmente se revelou como caduca desde a sua formação, mas o processo que a defendeu e que defendeu a Revolução por longos meses, processo de uma vibrante aspiração democrática, exigia uma resposta institucional, paralela à representação soviética e não contra ela. O novo poder não o quis e rapidamente deixou esta questão no esquecimento.


Rosa Luxemburgo, pelo contrário, em suas Notas sobre a Revolução Russa, aborda a questão de maneira mais prática: “Se a Assembleia Constituinte já estava eleita muito antes do ponto crítico, da rebelião de outubro, e em sua composição refletia a imagem de um passado superado e não da nova situação, a conclusão óbvia era liquidar esta assembleia caduca, não nascida, e convocar sem demora novas eleições para a Constituinte. Os bolcheviques não queriam e não deviam confiar o futuro da revolução a uma assembleia que refletia a Rússia de ontem, o período das debilidades e da coalizão com a burguesia; perfeito, tudo o que precisava ser feito era convocar imediatamente outra assembleia representando a Rússia mais avançada e renovada. (...) Em vez de chegar a esta conclusão, Trotsky se concentra nas deficiências específicas da Assembleia Constituinte reunida em outubro e chega a generalizar sobre a inutilidade de qualquer representação popular decorrente do sufrágio universal durante o período da revolução. (...) O que realmente restaria se tudo isso desaparecesse? Lenin e Trotsky substituíram as instituições representativas, que emergiram do sufrágio popular universal, pelos sovietes, como a única representação autêntica das massas trabalhadoras. Mas ao sufocar a vida polític em todo o país, a vida nos sovietes também fica paralisada. (...) Sem sufrágio universal, liberdade ilimitada de imprensa e de reunião e sem livre confronto de opiniões, a vida de toda instituição pública se extingue, se converte em uma vida aparente, na qual a burocracia permanece o único elemento ativo. Esta é uma lei suprema e objetiva, da qual nenhum partido pode se subtrair. A vida pública se adormece pouco a pouco. O erro básico da teoria de Lenin e Trotsky é que, exatamente como Kautsky, eles contrapõem ditadura e democracia. ‘Ditadura ou democracia’ é como os bolcheviques e Kautsky colocam a questão; o último se pronuncia logicamente pela democracia e, especificamente, pela democracia burguesa, que ele considera como uma opção contra a revolução socialista; por outro lado, Lenin e Trotsky defendem a ditadura em oposição à democracia, isto é, a ditadura de um punhado de pessoas, a ditadura segundo o modelo burguês. São dois polos opostos, equidistantes da verdadeira política socialista”.


A opinião de Rosa Luxemburgo é ilustrativa. Mas seria presunçoso dizer hoje que fizeram falta novas eleições para a Constituinte. Sua dissolução forçada em março de 1918 precede, em poucos meses, o início da guerra civil e da coalizão estrangeira que tentaria afogar a Revolução. Mas após a vitória, em 1920, o renascimento da vida democrática voltou a ser uma necessidade tão ardente quanto relançar a economia. Isto passava, como dissemos anteriormente, pelo reimpulsionamento dos sovietes esgotados através de uma transfusão massiva de liberdades recuperadas em seu interior, mas também pela reconstrução de um debate nacional democrático que levasse a eleições e a um organismo capaz de se converter no lugar de debate e de tomada de decisões sobre as opções políticas globais que afetavam todo o país. Portanto, não adotar esta via custou muito mais caro do que os riscos que se teriam corrido ao toma-la.


O poder: tomá-lo? Conservá-lo? Sempre?


O maior dos riscos é, efetivamente, o de perder o poder. Em nome deste risco e de maneira explícita, o desvio conduziu a uma ditadura (em princípio do proletariado) que, sem dúvida, era inevitável durante a guerra civil, em direção a uma ditadura do partido, apesar do fato deste se encontrar em grande medida limitado com relação a suas próprias tradições. Este risco era evidente durante toda a guerra civil, mas o que estava em jogo então era muito claro. É claro que, se houve vitória na guerra após dois anos de combates encarniçados, foi graças à mobilização de todo o país por detrás dos sovietes e de seu Exército Vermelho. Mas essa mobilização foi o resultado dos desafios sociais que prolongaram aquilo que estava em jogo na própria revolução.


Antes de outubro, a alternativa não estava entre a tomada do poder pelos sovietes ou uma democracia parlamentar mais ou menos estabilizada. Se resumia à disjuntiva entre a revolução até o fim ou o retorno a uma autocracia restabelecida pelos conspiradores da reação. Durante a guerra entre o exército branco e o vermelho, o primeiro foi rechaçado e derrotado porque, nas zonas que controlaram temporariamente, nada fizeram além de restabelecer a supremacia dos grandes proprietários [de terras] e dos capitalistas, ou seja, a autocracia desonrosa, já sem czar.


Este componente social – que tende a ser relativizado demais em todos os debates sobre a política propriamente dita – teria seguido sendo determinante adiante se a abertura política tivesse acompanhado as reformas econômicas. Provavelmente, teria existido o risco de que as eleições nacionais fizessem os bolcheviques retroceder, ou até se tornarem minoritários. Um século depois, a pergunta é: pode-se duvidar de que esta eventualidade era menos perigosa do que a catástrofe histórica que foi a degeneração da União Soviética? De partida, as massas russas estavam esgotadas e cansadas da guerra; aspiravam a uma rápida mudança em suas condições de vida. Mas é improvável que teriam optado então por votar nas forças que ameaçavam a restituir aqueles que a revolução havia derrotado e que a guerra havia vencido. E mesmo que tivesse sido assim, a luta teria renascido rapidamente para defender por todos os meios as conquistas da revolução, e teria encontrado sua tradução política nas eleições seguintes, renovando a confiança nos responsáveis ​​pela mudança social iniciada em 1917 pela revolução e pelos sovietes.


“Mas a minoria, o Partido, não pode implantar o socialismo. Poderão implantá-lo dezenas de milhões de seres, quando aprenderem a fazê-lo eles próprios”, afirmou Lenin no 4º Congresso Panrusso dos Sovietes. Em evidente contradição com esta profissão de fé, as decisões dos primeiros anos impediram a representação das correlações reais de forças políticas, bem como a distribuição do poder no interior dos sovietes.


Pode-se compreender que estas opções pareçam hoje em dia muito mais claras do que na fumaça espessa das batalhas da época. Os revolucionários de Outubro não eram, de partida, conscientes das consequências de suas decisões, constrangidos e limitados como estavam pelas circunstâncias dramáticas dos anos 20. As consequências, no entanto, se manifestaram de forma clara e bastante rápida. Entretanto, durante a década de 20, até os terríveis anos 30, ainda era possível uma mudança de tendência; além disso, sua possibilidade foi debatida no interior do partido bolchevique, no que restava dos demais partidos e em toda a sociedade.


Continuidade, descontinuidade, ruptura


Não há comparação entre a repressão dos anos 1918-1924 e a degeneração stalinista; não apenas em termos quantitativos, mas também em relação a seus mecanismos mais profundos. A repressão bolchevique se inscrevia na situação excepcional do choque violento da guerra civil. A simultaneidade do 11º Congresso e de Kronstadt marca uma mudança que favorecerá, sem dúvida, a degeneração stalinista. Mas a situação ainda não havia se estabilizado. A luta entre frações e os debates no partido revelam uma situação que ainda podia evoluir. É verdade que existem elementos de continuidade entre a época leninista e a reação stalinista, mas as descontinuidades e as rupturas são ainda mais importantes. No final da década de 20, e com a coletivização forçada de 1928, se produz uma ruptura histórica, primeiro com a derrota de todas as oposições e depois com a “normalização” do partido bolchevique, a difusão de um poder totalitário de repressão política e social em toda a sociedade russa, as deportações, as liquidações em massa.


A política stalinista não se inscreveu na dinâmica revolucionária, mas na defesa dos interesses particulares do centro stalinista e da burocracia, com seus privilégios, o que foi a base do poder pessoal de Stalin. É também uma política reacionária a nível internacional. O poder estabelecido já não defendia os mesmos interesses. O poder da burocracia substitui o dos operários e camponeses, representado ainda nos sovietes e no partido do início dos anos 20. É no coração mesmo da revolução que se desenvolve a contrarrevolução stalinista. Esta não é o resultado da anterior, apesar de terem existido erros graves durante o período leninista; é uma violenta contrarrevolução contra a própria base política do processo revolucionário, que finalmente conseguiu usurpar o poder.


A combinação fatal entre asfixia democrática, fadiga social, cristalização burocrática e, sobretudo, o expurgo brutal em grande escala com uma tremenda repressão, fez com que a continuidade revolucionária de Outubro se rompesse em pedaços. E agora que está quebrada, é necessário analisar claramente o que aconteceu, para que o curso dos acontecimentos possa ser distinto no futuro, quando a revolução se coloque a escrevê-lo de novo.


– Publicado no nº 34 da revista Contretemps (2017)


Notas [1] MANDEL, Ernest. “Outubro de 1917: golpe de Estado ou revolução social? A legitimidade da revolução russa” (IIRE de Amsterdã, 1992): http://www.vientosur.info/spip.php?article12178 [2] BENSAÏD, Daniel. “As questões de outubro” http://danielbensaid.org/Questions-d-Octobre?lang=fr [versão em português-br: https://blogdaboitempo.com.br/2017/08/15/bensaid-as-questoes-de-outubro/]

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